segunda-feira, 30 de novembro de 2015

Continuamos, pois!



 Desde há meses que não se edita nada neste cantinho, embora os Amigos do Livro tenham reiniciado as suas actividades em Outubro. Nesta fase,  optámos por, indo além da leitura comentada, produzir os nossos próprios textos.
Primeiramente sobre temática livre, como acontece com a participação de Augusta e  Joaquina; depois procuraremos trazer à escrita as memórias da nossa primeira escola.

1. Texto de Augusta
 Asa Negra

Na obscuridade do quarto, ele jazia exânime na sua cama articulada.

Ela ajoelhou-se, pegou-lhe na mão húmida e levou-a, docemente, ao rosto, beijando-a.



A fugaz aparição da asa negra da Morte pairava por todo o quarto.

Ele olhou-a, insistente, com os olhos já vítreos, num adeus derradeiro e, quiçá, suplicando-lhe que não o deixasse partir.



Angustiada, impotente, ela reclinou a cabeça na mesma almofada, exausta pela noite de vigília.



Os olhos fecharam-se-lhe, derrotados pelo cansaço, por migalhas de minutos.



Quando os abriu, entre a surpresa e a incredulidade, teve a consciência plena que a asa da Morte o arrastara, inexoravelmente, para bem longe dela.



Um arrepio inesperado percorreu-lhe o corpo e do seu peito estrondearam soluços. Agarrou-se ao cadáver e, esse momento, foi a última intimidade entre eles.



Levantou-se num esforço hercúleo, suportando o insuportável, e telefonou à família a comunicar a fatal notícia.



Raivosa de dor, pousou o telefone, ressoando ainda nos seus ouvidos os soluços dos filhos.



Nada mais disse. O silêncio caíra abrupto no aposento.

Recompôs-se e transpôs, suavemente, a porta, pronta a aconchegar nos braços o choro angustiado dos filhos, as palavras comovidas dos familiares e amigos, as condolências de conhecidos.



Fez, precisamente este mês dois anos que ele partiu.



Ela, todos os dias, no isolamento da sua casa, sente a dor da saudade, o desânimo, a solidão, e espera…Espera que, um dia, a mesma asa negra a venha buscar, talvez mais humana, consciente da dor que provocou nela durante anos, e a leve embalada docemente, conduzindo-a, sabe-se lá, para junto dele…





Outubro de 2015

                                               Augusta



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2. Texto de Joaquina Faia

Migrantes 

 



Todos os dias quando ouço as notícias na comunicação social e vejo as reportagens do drama dos refugiados, que neste momento está a acontecer, por toda a Europa, vindos do Médio Oriente, principalmente da Síria deixam-me comovida e preocupada.

Concordo com o acolhimento que lhes está a ser proporcionado por vários países, incluindo Portugal. No entanto, interrogo-me: O que irão fazer 4500 refugiados que vão dar entrada no nosso país. No espaço de dois anos? Qual será o tipo de trabalho que irão ter e a vida que vão levar?
Não deixo de pensar em milhares de emigrantes portugueses, em geral jovens, que, não tendo trabalho no seu país, foram aconselhados, pelos governantes, a deixar a sua terra, os seus familiares e partirem à procura de trabalho noutros destinos, para poderem sobreviver.
Será que vão ficar no nosso país por muito tempo ou, [quando possível,] tal como fazem milhares de jovens licenciados portugueses, sairão à procura de novas oportunidades?

É importante o acolhimento, mas é muito mais importante dar condições sociais e económicas a todos que recebemos, para que possam ficar e ajudar na construção do país.


Joaquina Faia Oliveira