Chamavam-lhe capitão,
e acabou por nunca nos explicar porquê. Partiu da nossa companhia, aos
86.Ficámos sem dele saber tantas coisas, por falta de assento para o
ouvir.
Cada velho, ao morrer, desliga a luz da sua biblioteca
íntima. Que importam os muitos livros que possa deixar na herança? Armando
Ferreira lia e dava-se a ler. Manteve-se
nos Vizinhos do Livro enquanto se
sentiu de boa saúde.
Passara uma vida
profissional lidando com tecnologias da comunicação, daí que
não se tivesse deixado intimidar com
os desafios da internet. Se, no centro de dia, o pessoal se resumia ao bingo e telenovelas, as senhoras, os homens batendo a seca da sueca, Armando estava ao computador.
Até há muito pouco tempo, insistia em
encaminhar mensagens de email, focadas na Beleza e Dignidade. Terá porventura
ficado entristecido quando os destinatários lhe não correspondiam .
Este blogue tem sido (Até quando?) o resultado
de uma espontânea vontade deste nosso Vizinho contar
histórias de si. Num dos nossos primeiros encontros de leitores, na
Associação, em 2011. Reuníamos então na cozinha, arrumada à pressa, depois
do almoço. Lembram-se?
Num repente, compreendi que um clube de leitura tem
todas as condições para se aventurar na escrita. As narrativas
individuais, filtradas ou nebuladas pelo tempo, também poderiam ser integradas
nas rotinas da leitura coletiva. E pouco
a pouco foram aparecendo escreventes. Que não se calem pois os contadores de
histórias. Aproveitemos, entretanto, para reler os textos do nosso amigo.
J B
“ Nota de(vida)
Parece acanhamento. Na obrigação de se justificar,
por não ter trazido o livro que se nos propusera ler. Levara-lho a filha,
desconhecendo o compromisso do pai. Olha agora! Que importância tinha isso? Não
se preocupasse, o amigo Armando. Em vez dele, leria a Fernanda, para tanto se
preparara, com Internet e voltas quejandas, só para acepipar o nosso principal
naco de prosa: A Ceifeirinha de Estremoz, do Altino Tojal
Ou estaria o senhor Armando em dia-não?
Estava mesmo! Em dia de não permanecer aqui, no
grupo dos Vizinhos do Livro. Por onde parava então?
Empurrado pelo pessimismo do narrador da
Ceifeirinha, Armando refugiou-se no Forte da Cruz. Pois, Estoril. Lá nascera.
Quando? Oh, isso ainda o Salazar - “Sei muito bem o que quero e para onde vou “
- andava a atamancar as Finanças. Às ordens do Carmona, salvo seja.
Primeira infância numa quinta onde os pais eram
caseiros. Ou seja: num castelo. Que fique claro: castelo ou quinta? Ambos. Um
castelo, aliás dois. O grande, residência dos patrões; numa réplica, o
castelinho, albergava-se o pessoal. Revivalismo de arquitectura militar, contra
fantasiosos ofensivas marítimas. Domínios de verão, que o proprietário gostava
de ver sempre num brinquinho. Escrevia para mandar fazer, aguardava ao longe os
resultados. Sabe-se lá por quanto tempo. Ora, patrão fora…
Até um dia.
«Ò Armando, vai já chamar o teu pai, que está cá o
senhor Lamas?»
Mal estariam as coisas. Aquele senhor Lamas… Armando
lembra-se de, ao brincar na escada do castelo, ter sido pisado pelo patrão.
Gritou de dor, mas o homem continuou a descer, insensível às queixas da criança
Parte o garoto pelo pai, embora corredor de seis
anos, já muito consciente da gravidade do momento. Ainda não o alcunhavam de
Colibri, pela sua pequena estatura. Colibri fosse ele, não voaria mais
pronto Em direcção ao mar, à rocha, logo ali perto, donde o pai costumava
lançar o anzol.
Azar e desencontro. Mal sai o rapazote, chega
o pai, anunciando peixe fresco, com ruidosa alegria. Surpreendido pela cara de
pau do Senhor Lamas. Com que então pescarias à hora do trabalho? Acabou-se:
despedimento. Tudo passa tão depressa.
A família encontra novo poiso no Vale de Santa Rita.
Aproveita-se a vizinhança dos Salesianos para que o Armando vá frequentar a
escola primária.
Continuamos? Sim, Senhor Armando, somos todos
ouvidos. Contudo esfria a conversa. Que se passa?
Aquele olhar parado? Hoje e sempre, diante de um
condiscípulo, Mário – veio-lhe o nome mais tarde –, levado pela doença. Assim
se aprende a morte, neste caso, à custa de um ror de insónias, por noites
intermináveis.
Regressava uma tarde dos Salesianos, sempre a
matutar na morte, quando, clic!, avista no chão, sem tirar nem pôr, uma máquina
fotográfica Tal como a que vira nas mãos do senhor Lamas.
Alegria curta.
«Dá cá isso, miúdo!» gritou-lhe um matulão do selim
de uma bicicleta. Ainda pensou:
«É o dás!»
Já o interlocutor lhe encostava ao peito franzino a
roda da bicicleta. E mastigava: «Vais dar a bem, ouviste?» Ouvira e obedeceu.
Acabou o sonho de tirar fotografias à família. Por
muito tristes que todos andassem, haviam de sorrir para o passarinho.
Voltemos à realidade. Não podendo a família criá-lo,
vê-se confiado a um tio, morador em Estremoz. Fora o nome da localidade
alentejana que, afinal, deu corda a esta história.
Aos dez anos entra na Escola Industrial e também
numa oficina de tipografia do tio. Estudante e aprendiz.
Guerra! Primeiro ali na vizinha Espanha, depois pela
Europa fora. E o tio a saborear as notícias de vitórias, trazidas por uma rádio
alemã. Salazar, Franco, Mussolini, Hitler... «Favas contadas!» cantarolava o
homem, no fim de cada a emissão.
Armando sente fascínio pelas melhorias materiais em
casa do tio, sobretudo por haver electricidade. Em contrapartida, deprime-o o
ambiente repressivo. Consideram-no mais um serviçal do que um familiar. Ameaças
constantes de ser recambiado para os pais. Quem lhe disse: «O teu pai um dia
mata-te!», o tio, de ríspida voz? Ou a mãe, encorajando-o a suportar a estadia
em Estremoz?
Isola-se, convivendo apenas com um colega da escola,
também seu parceiro de ofício, na Tipografia Progresso.
Seria alguma vez tipógrafo? Talvez se adaptasse, no
entanto a electricidade atraía-o muito mais do que as artes gráficas.
Refugiava-se no armazém do material, uma antiga igreja, para fazer
experiências, imaginando novas instalações eléctricas para a oficina do tio?
Que se descontrolava, furioso, a cada curto-circuito. Não percebia o rapaz que
estavam em risco, papéis, tintas, máquinas, postos de trabalho? Vais queimar
isto tudo, Colibri!
Também era um modo de se esquivar a recados e a
pequenas tarefas no escritório.
Pequenas, ou talvez não. Vejamos as coisas do ponto
de vista da contabilidade. Encarregam-no de preencher recibos, indicam-lhe a
fórmula de cálculo do valor do selo, consoante o montante da factura. Branco é,
para o adulto que lhe confia a tarefa; caldo entornado, feita a expedição para
os clientes do mês. Armando não fora alertado para a destrinça entre selos
fiscais e postais. Daí que sobrescritos e recibos tivessem seguido com o mesmo
tipo de estampilha. De correio!
Mais um disparate para o rol. Prejuízo do
tio/patrão: “Uma pipa de massa!». Gritavam-lhe que não andasse a dormir no
trabalho.
É que andava mesmo, ou quase: Todas as manhãs
detestava acordar e seguir para a oficina. As aulas nocturnas roubavam-lhe a
cama.
Mas quem sabe se não foi aquela troca de franquias
que lhe chamou a atenção para a filatelia?
Erros daqueles deixavam sequelas. Armando está
farto, escreve aos pais, pedindo para regressar ao Estoril. E satisfeito,
consegue voltar, sozinho, de comboio.
Ah, agora quer quantificar o primeiro salário na
oficina: sessenta escudos… «Bom, e com esse dinheiro comprava…?
«Ora bem. Mandei logo pôr meias solas, nos sapatos,
que me ficaram em trinta escudos!» O resto era para guardar, excepto algumas
moedas com que alugava uma bicicleta.
Estávamos elucidados, amigo Armando.
Adeus, patrão tio. Adeus Estremoz.
Retorno ao Estoril. Em Cascais, outra tipografia o
esperava: a Cardim. «Isso mesmo, naquele tempo, composição manual, dá cá um A,
toma lá um B…» Tudo alinhado. Atenção ao tamanho e tipo dos caracteres… Nada
que se misturem no componedor ou nas caixas. Tintagem, primeira prova, mais uma
olhada para evitar o refilanço do revisor ou a reclamação do cliente. Siga a
obra. Não esquecer que as tintas e até os rolos eram fabricados na oficina. Daí
que andasse sempre manchado dos pés à cabeça. Estoirado ao fim do dia,
regressava ao Vale de Santa Rita.
A tipografia Cardim, ainda existe, embora, para o
Armando, o ofício não tivesse sido de longa duração. Crise de desemprego.
Nem sempre a vida militar é uma alternativa ao
desemprego. No entanto, tenta a sorte na Força Aérea, onde recrutavam
voluntários, a partir dos dezasseis anos. Por mais de uma vez se viu preterido
por mancebos mais encorpados. De nada valeram as pedaladas na bicicleta, entre
o Estoril e a Granja do Marquês, porque, a voar alto, o nosso Colibri de
Estremoz não o faria com as Asas de Portugal.
Vai procurar ocupação em Lisboa. Hospeda-se em
casa da tia Cecília, num primeiro andar da rua Almeida e Sousa, à Estrela.
Aparece-lhe uma nova oportunidade. Numa casa de
artigos eléctricos da rua dos Bacalhoeiros. Prestavam-se também serviços de
canalizador. Armando não esquece o esforço ao ter de esgalgar o passo, sob o
peso da bomba de desentupimentos. Não aquece o lugar, mas reconhece-se
novamente mordido pelo bichinho da electricidade. Decide então aprender a fundo
as bases do trabalho de electricista, numa outra casa da rua Joaquim António de
Aguiar. Nunca saía de um emprego sem ter trabalho certo noutra casa.
De repente, corre-lhe mal a vida quanto a
hospedagem. Abandona de casa da tia Cecília. Não, não vai dormir ao relento.
Não tarda, tem trabalho, cama, mesa e roupa
lavada debaixo do mesmo tecto. Como moço de cozinha, na Pensão Primorosa, à rua
de Santa Justa., perto do elevador. Estabelecimento com fama de bem encher os
estômagos a empregados de comércio e serviços. Armando vê-se a carregar
marmitas durante uma boa parte do dia, desde Santa Catarina e Bairro Alto até
Santa Clara.
Fora isso, tem de acompanhar a patroa nas compras da
pensão, alombando com as alcofas. Por exemplo, o açúcar… Racionado com a
Guerra, nem por isso faltava na modesta Primorosa, que, por razões
desconhecidas pelo moço de cozinha, chega a suprir as carências de um reputado
hotel da vizinhança.
Tem 17 anos e a insaciável curiosidade de todos os
jovens inexperientes. Como se faz aquilo? Está-se a fazer entender? Claro,
senhor Armando, continue, por favor.
Não era só com açúcar que a Primorosa adoçava a
vida, também cuidava dos corações, se assim se pode falar. Quartos alugados
para entrevistas. Um deles, contíguo ao dormitório do pessoal, no sótão, está
sempre a mudar de ocupantes. Mal sabiam os felizardos que o nosso Armando, por
um orifício no tabique lhes observava a trama do encontro. Nem sempre com a
devida discrição, o que origina protestos, por suspeitas de violação da
privacidade.
É aí que um colega, porteiro da noite e batido nas
andanças, lhe dá uma ajuda. Leva-o ao Bairro Alto. Seja Armando actor, deixe de
se preocupar com as cenas do quarto ao lado. Na vida, não se pode perder tempo
a espreitar pelos buracos.
«Primeira visita às meninas» confia-nos o senhor
Armando.
Terminada a sessão, desciam a escadinhas do Duque,
quando o porteiro da noite lhe disparou a má notícia: o patrão, tomando em
considerando as queixas dos hóspedes espiados, ia despedi-lo.
Eh, pá! Estariam os degraus escorregadios? Aguentou
o golpe. «Deixá-lo….» No quarto do Bairro Alto sentira uma descarga eléctrica…
«Volto para os interruptores!»
Para as obras. Não faltavam, na altura, casas em
construção. Pelo Areeiro. Sempre haveria lugar para mais um electricista. Ou
para quem com eles já falara.
Porém, cautela e caldos de galinha… Electricista que
dorme em serviço está frito. Ou torrado.
Ora, a segurança com a electricidade também se
aprende. Se o Armando não passou por escolas técnicas do ramo, ainda lhe resta
uma universidade. Popular e módica: a dos cursos por correspondência da Rádio
Escola.
Com a tarimba do Areeiro, mais uns largos meses de
folhetos, revistas e livros está apto à promoção. E foi a oficial. Então e
formação contínua? Para já, a partir das publicações técnicas – lembram-se da
Mecânica Popular? - expostas no quiosque do Cais do Sodré. Quiosque
da prima, que não lhe recusava empréstimos ou cedências por esquecimento.
Passado estava o tempo em que era alcunhado de
Colibri pelos colegas de Estremoz! A que pássaro o comparam agora? Águia, ou a
qualquer outro senhor dos ares? Lá chegaremos. Comparações sim, mais alcunhas
nem pensar. Respeitinho.
Passa a ter nas mãos o segredo das caixas falantes.
Perdem o pio, enrouquecem, queimam-se-lhe as válvulas, avaria-se-lhes o
amperímetro, não apanham certos emissores…Pois, estimado cliente, deixe ficar.
O Armando conserta. Na rua do Jardim do Regedor, Rádio Luxor.
Também quer falar das galenas. Telefonias dos pobres,
minha gente! Explique, senhor Armando. Longo percurso da pedrinha mágica das
galenas, aos semicondutores, aos transístores. A pedrinha era o segredo.
Colocada no interior de uma bobine de cobre, agarrava os sons, à medida que se
rodava o botão sintonizador. Por tuta-e-meia montava um daqueles
aparelhómetros, o dispêndio maior estava nos auscultadores. Não faltavam
encomendas.
Neste ponto da narrativa, alguém recuou a 1953, ao
momento em que a professora da terceira classe o incumbiu de seguir, através da
galena dum vizinho, as cerimónias comemorativas da chegada de Salazar ao
Governo, vinte e cinco anos antes. Bem mandado, o rapazinho ouviu tudo, no
entanto, no dia seguinte foi incapaz de repetir patavina na escola.
Voos mais altos; senhor Armando. Acenam-lhe para a
Philips. É um tempo em que os patrões ainda têm apreço por quem sabe trabalhar.
Quem se preocupa com a perfeição.
Não tarda a aparecer-lhe outra águia da
electricidade: a alemã Siemens. O encarregado tinha tirado o curso de rádio na
Marinha. Partilha com ele livros e revistas. Há coisas novas. Que já desvanecem
os países ricos, mas Portugal há-de andar sempre a reboque. Até um dia
Um dia, chegaram os televisores.
Vinham encaixotados do estrangeiro, aos tombos,
careciam de revisão antes de serem entregues aos distribuidores. Poucos
defeitos de fabrico, como se calcula. Ou coisa de pouca monta que se resolvia
com umas porradinhas na caixa. Manias das válvulas!
Vendem-se logo aparelhos para cafés, algumas tascas,
sociedades recreativas… Não se pense que eram baratos. Compram-nos algumas
famílias de mais posses. Os operários e empregados de comércio que esperassem
mais uma dúzia de anos, pelo menos. Ou fossem ver televisão ao café da esquina.
Ficassem as patroas em casa a lavar a loiça, a zelar pelas obrigações
domésticas, como sempre fora. Não é? Aí, impuseram-se elas: era o que faltava!
Também queriam ir.
Não por causa do futebol, nem dos concursos de
saber ou sorte, mas pelas peças de teatro, pelas toiradas, pelos programas de
variedades …… Vissem os homens no jornal diário o que dava a televisão para
elas fazerem os planos de ida. Foi assim que o café, a tasca, a sala de sueca
deixaram, apesar de muitas resistências, de ser refúgios masculinos. Por outro
lado, com a saída para ver o pequeno ecrã, até se alteraram os índices de
natalidade. Realmente, o mundo mudou por causa daquela caixa.
Armando vê o salário duplicar, em relação ao que
ganhava nas obras. Passa a receber um conto e duzentos, mais as horitas
extraordinárias.
E até uma ou outra gorjeta dos clientes. A casa de
quem vai dar assistência. Algumas vezes teve de avisar: «Olhem que isto
pode afinar-se com umas palmadas, mas é preciso saber dá-las. Não é a força, é
o jeito».
Toda o apoio em Lisboa era feito a pé. Armando
reforça a nota inicial: a pé… e sozinho. Sempre sozinho. De mala da ferramenta
na mão. Ah sim, ainda tem hoje uma dessas malas companheiras do passado.
Pelas ruas de Lisboa, ocasionalmente, até dava para
pequenas pausas. Nada mais soubemos sobre as meninas do Bairro Alto. Mas há
tantas meninas bonitas no cinema: Cinearte, Éden, Europa…Sem abusar, claro,
porque cinema era coisa de fim-de-semana. Quer no Estoril, quer em Cascais
nunca falhava uma fita. Diz ter sido nesse tempo «um louco do cinema»
Tudo a bom ritmo na Siemens de Lisboa. As delegações
do Porto também cumpriam. Armando viajava até lá, ou até Faro, assistindo
clientes no Alentejo e Algarve. Abrem-lhe a porta com veneração, chamam-lhe
“amanhador de televisões”. Revelam-lhe segredos de família.
Aquela mulher alentejana perdera a voz da telefonia,
a voz que de muito longe lhe trazia algum conforto, em ondas curtas, na
ausência do marido, preso em Peniche. Reparação gratuita, sorri o Armando. Para
logo acrescentar que ia, uma manhã de Abril, pelo Alentejo fora, em S.
Teotónio, quando o rádio do carro transmitiu as primeiras notícias sobre o
levantamento das Forças Armadas.
Entretanto, um dia dá-se na Siemens a substituição
do director geral. Vindo da Bosch, apareceu a comandá-los um doutor, sabe-se lá
em quê, completamente ignorante em matéria de electricidade e seus derivados.
Todavia de elevadíssima craveira, no domínio das ameaças ao pessoal. Agora a
empresa ia fiar mais fino. E quem não estiver bem, mude-se.
Discurso aterrorizador, na tomada de posse,
passagens emproadas a caminho do gabinete, ordens de serviço à mínima niquice.
O Senhor director! “Sei muito bem o que quero e para onde vou “.
Está bem, abelha! Se a rotina tem muito peso, o que
dizer das manhas de quem lhe conhece as voltas. Por exemplo: apesar de bastante
rigor, nos balanços, nunca se descobriam os buracos, devido à prévia deslocação
de material entre as delegações. Parece que era um processo de gestão aprendido
pelo chefe, na Marinha. Boa escola!
«Muito bera, aquele director.» Caído em derriço nos
braços de uma escriturária, depressa forneceu aos trabalhadores oportunidade
para confirmar como todo o mandão fraqueja!
E o Salazar, amigo Armando?
«Ora esse também se foi abaixo. Ao fim de
quarenta anos caiu da tripeça. Não, não foi no Forte da Cruz… Fora tal senão,
ainda hoje aí estava a repetir: “Sei muito bem o que quero e para onde vou “.
Estaria?!
Assim, estão lá outros.
«Ora eu que nada tenho a ver com essa gente, também
ainda cá estou. Pois, pois, com oitenta e um anos.»
Rio de Mouro, Julho de 2011
“
História de vida do Senhor Armando.
Repartida pelos Vizinhos do Livro, e relatada por Joaquim Beja